Comentário Final

É interessante valorizar o comentário, a pergunta, o acréscimo ocorrido ao final da entrevista, quando o participante foi perguntado pela entrevistadora: Tem alguma coisa que o senhor queira falar que eu não tenha lhe perguntado?

Questões ou significados particulares relativos ao adoecimento foram comunicados juntamente com questões compartilhadas por vários, como as relativas à cura. Agradecimentos aos profissionais de saúde e às instituições, e inclusive à pesquisa e à entrevista pela esperança de uma maior divulgação e diminuição do desconhecimento e do preconceito com relação à doença. Mensagens aos profissionais de saúde e à população.

Há participantes que nos contaram o significado do seu adoecimento por hanseníase. Jucenir, por exemplo, com sua religiosidade, interpretou ter recebido “uma mensagem de Deus” que lhe foi enviada para que ele conseguisse ter um determinado aprendizado ou uma “superação”, pois ele estava “bebendo muito, com muitos ciúmes da esposa, em crise no casamento”. “Essa doença se manifestou em mim para me salvar e salvar meu casamento - eu achei este sentido”.

Já para Felipe, estudante de medicina, o adoecimento por hanseníase lhe proporcionou um aprendizado para seu futuro profissional. 

“uma coisa que me mudou muito, que me marcou foi que eu acho que eu era muito afastado da questão das pessoas, sabe? Eu acho que quando eu passei por uma doença dessa, eu vou procurar muito mais ajudar as pessoas a entender e fazer algo pelas pessoas, entendeu? Sim, porque eu nunca gostei de relação interpessoal, eu não gosto de conversar, eu não gosto de nada. Eu gosto de ir lá - eu sou bem quieto, bem introvertido - eu gosto de ir lá e fazer o que tenho que fazer e ir embora pra minha casa. Chego, sento no fundo da sala, fico quieto, não falo nada, sou bem introvertido. Mas depois que eu passei por isso, eu senti uma necessidade de me preocupar mais com as pessoas para ajudá-las, sabe? Isso foi bem impactante na minha vida, principalmente até como médico, isso me ajudou muito, passar por isso. Foi uma experiência muito boa para crescimento pessoal, acredito que isso foi bem interessante, acredito. [...] Eu nunca tinha me colocado no lugar do paciente como eu me coloquei quando eu fiquei doente desse jeito.”

 

Há, ainda, quem manifeste um interesse ou até faça perguntas sobre uma preocupação, um problema relacionado à hanseníase, como por exemplo, os direitos junto ao INSS, o direito à fila preferencial nas unidades de saúde, como nos fala Francisca. Ou, ainda, há quem se encha de coragem para perguntar algo que lhe é difícil como, por exemplo, se a hanseníase ou seu tratamento podem dificultar o aprendizado, e mesmo a alfabetização, como nos pergunta Maria Anábia

Há participantes que aproveitam a oportunidade para fazer uma pergunta que já foi feita a outros profissionais, mas um sentimento de desconfiança o faz perguntar de novo. Esse sentimento de desconfiança está sempre referido à cura que foi anunciada pelos profissionais e não ocorreu. Há também quem faça a mesma crítica à “propaganda enganosa” de que a “hanseníase tem cura”. 

Alexsandro: Doutora, deixa eu te fazer uma pergunta para senhora: tem cura?

Entrevistadora: Você resolveu me perguntar! Mas aí não vale [sorri], aqui quem pergunta sou eu, mas vou dizer pra você perguntar pra professora Kátia, pode ser? Você já perguntou pra ela?

Alexsandro: Eu já perguntei, ela me fala que tem, ela nunca vai me falar que não tem. Não tem como.

Entrevistadora: Mas você não acredita que tem cura?

Alexsandro: Pra Deus tem. Essa doença não é de Deus, não é mesmo.

Entrevistadora: Mas pros médicos, você acha que é difícil eles curarem?

Alexsandro: Não, não tem não. Não, pros médicos para curar tem, tenho certeza?

Entrevistadora: Mas afinal tem cura ou não tem cura pra você?

Alexsandro: Se o médico fala que tem cura e pra Deus tem, então tem cura! Vou falar que tem cura!

Entrevistadora: Mas você fica intrigado?

Alexsandro: Eu fico, e fico muito. Quando me chama assim eu fico até com medo, mas tá bom, tô feliz.

 

Entrevistadora: Tem alguma coisa que o senhor queira falar que eu não tenha lhe perguntado?

João: Não, não. É porque eu sempre me preocupei, era assim de..., assim como voltou - foi bom a senhora me perguntar isso, porque mais uma vez eu vou perguntar, eu já perguntei, me falaram que não. Porque assim como eu fiz o tratamento e voltou os problemas da maneira que voltou, será que tem possibilidade de eu transmitir isso pra alguém na minha família?

Entrevistadora: O senhor sempre faz essa pergunta? Tá fazendo, já ouviu a resposta?

João: É, a resposta que eu tenho é que não, mas eu tenho as minhas dúvidas.

Entrevistadora: Mesmo o senhor tendo ouvido de alguns médicos que não, o senhor fica em dúvida?

João: É, porque... Por isso, porque quando eu fiz o tratamento pela primeira vez, me falaram que eu estava curado, e eu achei que não teria mais problema nenhum com ela, e eu voltei a ter.

Entrevistador: Entendi.

João: Aí por isso que eu pergunto pra senhora, mas como a sua opinião é a mesma. [risos]

 

Lóris critica a propaganda sobre a cura da hanseníase e se preocupa com a dificuldade do diagnóstico precoce: 

“Eu acho que tem umas propagandas, que o pessoal fala assim sobre hanseníase, que tem cura, eu acho assim, eu acho assim que é uma parte um pouco enganosa, porque eu nunca conheci ninguém que tenha se curado 100 por cento de hanseníase, e que não sofre nenhuma sequela, nenhum medicamento, eu não conheço. Eu gostaria que se realmente tivesse, porque eu acho... E outra coisa também, quando a gente procura também, muitas vezes porque a gente já tá sentindo uma causa, um sintoma já bem elevado, porque eu acho assim, que se tiver cura, talvez no começo, e eu acho que ela demora, no meu ponto de vista, eu não sei, eu acho que ela demora pra ser diagnosticada, assim, não pela medicina, mas pela gente, pelo sintoma que a gente sente.”

 

Há vários participantes que tecem elogios e agradecimentos aos profissionais de saúde responsáveis por seu tratamento, às instituições que de alguma forma tem prestado assistência. Vários também apontam que a hanseníase é uma doença pouco divulgada, que as pessoas não têm informação sobre ela, nem mesmo médicos não especialistas nela. 

Destacamos a mensagem emocionada de Marizélia para os profissionais de saúde que estão com o paciente recém-diagnosticado de hanseníase: 

“Eu acho que foi tudo falado, esclarecido. Mas uma coisa que eu acho primordial pra uma pessoa que vem com hanseníase no desespero que eu vim, que eu tava, é fazer o que minha amiga fez que foi a Valmira [se emociona]: pegar na mão da gente, sabe, o contato físico é muito importante. Importante demais. O contato que o médico tem, que o enfermeiro tem para com o paciente. Fazer o contato físico. Pegar na mão da pessoa, porque isso, a pessoa fica com medo de estar passando a doença, de estar... sabe a pessoa fica se sentindo assim... É o pior... É o pior das pessoas, assim, você é a rejeição. Se um médico pega na mão do paciente e diz: ‘olha, isso é uma doença que tem cura, você não fique desesperada, agradeça a Deus por ter essa doença e não ter outra que não tenha cura. Você vai superar. Você vai melhorar’.”

 

Em seguida, compartilhamos a mensagem de Matheus para as pessoas que estejam na dúvida se estão ou não com hanseníase: 

“Sobre a hanseníase: o benefício da dúvida é muito ruim, não vale a pena duvidar se é ou se não é, vale a pena vir para um profissional especializado, e descobrir se é ou não; a outra parte é que o tempo não é seu companheiro no caso dessa doença, quanto mais tempo pior o caso. Então vale a pena dar um passo adiante, dar um passo contra ignorância, contra o desconhecimento, e vir procurar uma opinião. Isso vai levar com certeza a uma melhora, se for um portador. Essa é a minha opinião.

 

Com relação à pesquisa e à entrevista, duas participantes fizeram seus comentários. 

Yara considera que tentar “minimizar” o caso da hanseníase, dar a importância que estamos dando, e tentar “aumentar a conscientização sobre a doença” é algo "heróico, que não tem preço”. Reconhece que a hanseníase não é a única doença que precisa disto no nosso país, mas ela certamente precisa.

Por fim, Ermelinda destaca que a divulgação poderá diminuir o preconceito e o grande sofrimento causado por esta doença: “Eu quero agradecer a todos vocês por ter ajudado a gente. Ajuda muito. E que através dessa entrevista, que pode muita gente ficar sabendo, é bom, que a gente se liberta desse mal. Agradeço a todos por isso.”