Luciana - Enfermeira de Família e Comunidade
Luciana inicia sua experiência compartilhando que em janeiro de 2020, início da pandemia, ela estava de férias, e logo em seguida quando retorna ao trabalho em março, ainda não haviam decretado pandemia, mas que já se sabia algumas coisas sobre a COVID-19.
Em março, Luciana foi a Brasília para um congresso e, ao chegar na cidade, se deparou com muitas pessoas preocupadas e ainda sem muitas informações sobre a COVID-19. Ela também contou que nesse congresso as pessoas não estavam usando máscara. E ao retornar desse evento, ela diz que o serviço que trabalhava já estava diferente, tomando novos cuidados, como ler informes tentando adequar a atenção primária.
O serviço fechou com o decreto da pandemia, e a partir disso a equipe passou a ir nas casas para oferecer testes rápidos da COVID-19. Ela diz que quando um caso se confirmava, ainda não havia uma orientação de como conduzir o caso, e que esses testes serviam como uma forma de quantificar os casos em Botucatu. Após determinado tempo, foram criadas medidas que serviram como guia para a equipe atender determinados grupos, porém, outros grupos deveriam receber informações sobre a doença e deveriam retornar para casa, sendo atendidos somente os sintomáticos mais graves. Luciana compartilhou que isso foi muito difícil para ela: “dávamos informação na porta de que as pessoas não poderiam entrar, que só entrariam os sintomáticos respiratórios. Então, era um desgaste muito grande. Foi necessário, porque foi a partir disso que organizamos o serviço […] mas, para mim teve um impacto muito ruim nesse sentido, Como você dispensa uma pessoa hipertensa? Uma pessoa com diabetes, um idoso?”
Com o serviço da atenção primária fechado, a equipe passou a fazer um trabalho de orientação da população, indo a praças e comércios. Os profissionais também foram para hospitais atuar na testagem da população. Ela contou que a dinâmica dos espaços teve que ser revista algumas vezes até chegarem ao consenso de fazer os atendimentos dos pacientes em tendas ao ar livre, na área externa da própria unidade de atenção primária. Com isso, ela diz que haviam quantidades enormes de testagem diariamente e que o serviço era desgastante. Além disso, havia também as pessoas que chegavam sintomáticas respiratórias para serem atendidas na unidade, como crianças e pacientes crônicos descompensados. E não era incomum os profissionais atenderem casos de emergência, como Luciana compartilhou sobre um paciente que chegou descompensado e faleceu na sua unidade e por ser um momento de incerteza, sobrecarga e desorganização da rede pandemia, a equipe não sabia qual serviço deveria ser recorrido para o manejo da pessoa falecida. Luciana diz que era difícil e a equipe teve que receber auxílio para serem treinados a como fazer atendimento de emergência dentro da atenção primária.
Quando a vacina chegou à atenção primária, ela diz que foi outro ponto a ser visto com cautela, pois tiveram que selecionar qual a população tomaria a vacina. E ela diz que foi desgastante, pois haviam poucas doses e tinham que tomar cuidado para não desperdiçar nenhuma. Um ponto positivo foi que quando a vacina chegou em maior quantidade para toda a população, ela diz que houve uma mobilização de todos profissionais da saúde para vacinar e ela acredita que esse momento uniu os profissionais, dando um sentido de gratidão ao aplicar as vacinas.
Depois desse período, Luciana compartilhou que as tendas montadas do lado de fora do serviço não comportavam a grande quantidade de pessoas que chegavam, e com isso, começaram a atender dentro da unidade de saúde. Nesse momento, ela contou que foi quando os profissionais mais se contaminaram. Foi quando o SESMT (Serviços Especializados em Segurança e Medicina do Trabalho) foi acionado para auxiliar a equipe, e constataram que havia poucos profissionais para muitos pacientes, de forma que estava sobrecarregando a equipe. Então, a secretaria de saúde do município contratou mais profissionais para atuar na unidade. Luciana acredita que foi um período muito difícil. Além disso, também teve profissionais que não conseguiram exercer sua função durante a pandemia por prejuízos emocionais, o que também fragilizou a equipe. Ela acredita que mesmo sendo um momento difícil, houveram aprendizados. E ela diz que sempre que a equipe percebia que os cuidados não eram suficientes para os recursos que eles tinham, de prontidão buscavam outros profissionais para auxiliar e treinar a equipe.
As relações dos profissionais com seus familiares também foi prejudicada, ela compartilhou que alguns profissionais tiveram de se isolar para não contaminar os familiares. Outro ponto é que toda semana os profissionais deviam fazer a testagem para a COVID-19 e a aderência era baixa, e ela acredita que era porque havia uma ideia de que eles não poderiam pegar a doença, pois tinham que atender os pacientes, e também havia um sentimento de culpa quando testavam positivo para a COVID-19. Luciana diz que teve algumas vezes em que teve que chegar ao profissional para dizer que precisava ir embora e que alguns eram resistentes.
As escalas do serviço funcionavam com os profissionais e os alunos. Todos os dias eram enviados a lista dos alunos disponíveis e formavam duplas de um profissional com um aluno. Ela diz que acreditavam que essas escalas de porta funcionariam por pouco tempo, entretanto durou anos, e isso começou a desgastar a equipe e principalmente os residentes. Ela contou que foi difícil, pois as funções que antes existiam no serviço passaram a não existir com a pandemia e o fechamento da atenção primária. Muitos profissionais se sentiram descaracterizados e foi um ponto que precisou ser contornado. Para isso, começaram a fazer escalas mais flexíveis para que os profissionais pudessem descansar mais e não ser algo tão pesado.
Pessoalmente, Luciana teve um impacto quando as portas da atenção primária se fecharam. Ela contou que chegou a pensar que nunca mais conseguiriam organizar o serviço após esse fechamento. O sentimento dela é que a atenção primária ficou em segundo plano: “como que a gente não está dando atenção para a atenção primária?”. Ao mesmo tempo, ela acredita que esse fechamento foi necessário naquele momento. Ela compartilhou ainda que nunca o serviço se encerrava nas oito horas diárias. Sempre que chegava em casa, buscava ver os boletins diários do ministério da saúde. Quando chegava no dia seguinte para a vacinação, não era incomum terem recebido menos doses do que o previsto e isso a deixava chateada: “meu Deus, de novo isso. Mas, tudo bem, é o meu papel, vamos tentar.” Mesmo não atendendo diretamente, pois atuava na coordenação, Luciana era muito requisitada para resolver os problemas que apareciam na rotina. E ela diz que tinha que lidar com essas sobrecargas. Para ela, o grande impacto pessoal foi não conseguir ver o crescimento do seu filho durante a pandemia e se questiona se ela não fosse profissional da Saúde se teria sido diferente. Luciana teve COVID-19 duas vezes, mas não teve sintomas graves, apresentando somente tosse. Ela diz que enfrentou de maneira tranquila das duas vezes da doença.
Pamela - Enfermeira de Família e Comunidade
Pamela, na entrevista, conta sua trajetória na linha de frente no combate à pandemia. De início, relembra como foi o processo para mensurar que, de fato, estava acontecendo uma pandemia mundial. Na época, até começarem a se confirmar os primeiros casos na região onde trabalhava, sentiu insegurança e desconfiança se o vírus era contagioso. Por ser uma realidade muito nova para todos, Pamela ainda não sabia como lidar com alguns protocolos e com a responsabilidade de ter que colher swab nasofaríngeo, fazendo parte de uma das primeiras equipes de coleta da cidade de Botucatu, no Hospital Sorocabano. Apesar disso, encarou o desafio, afirmando que “não, eu estudei para servir, para acolher as pessoas, para cuidar das pessoas, então, a gente que vai ter que fazer, e a gente vai fazer”. O trabalho de colher swab dos pacientes era, de certa forma, solitário. Ficava sozinha e isolada dentro da sala realizando os procedimentos, enquanto sua colega de equipe ficava sozinha do lado de fora transcrevendo os resultados e ajudando nas condutas iniciais frente a um teste positivo. Pamela diz que, no início dos testes que davam negativo, tinha dúvida se realmente estava fazendo da maneira correta. Essa dúvida se esclareceu à medida que os testes davam positivo. Apesar de ser uma notícia ruim para os pacientes, significava para ela que o trabalho de triagem estava sendo bem feito. Com o tempo, várias equipes de testagem foram se formando, se disseminando e descentralizando. No fim de dois ou três meses, todas as unidades já tinham a sala de coleta de Covid e alguns protocolos já haviam sido construídos junto com a Secretaria de Saúde.
Ao ser perguntada sobre o processo de ser escolhida para a função de coleta, diz que se prontificou a fazer esse trabalho. Na ocasião, sentia receio por parte dos colegas e, por ter personalidade com a característica de enfrentar o desconhecido, decidiu assumir a tarefa. Refere que esse momento da pandemia foi importante para a união entre os profissionais do serviço de saúde: “Estava todo mundo com o mesmo foco. Todos estavam com o mesmo pensamento, que era o combate do Covid.” No dia a dia, ela era responsável por organizar o material da coleta. Quando foi devolvida para a unidade, os atendimentos começaram a ser feitos na área externa para garantir a distância adequada entre as pessoas e diminuir o contato ao espirrar e tossir pelo aerossol. Essas medidas e a segurança colaboraram para que ela não se contaminasse até o momento da entrevista. Relembra que costumava conversar com os colegas sobre o medo de contaminar os familiares porque tinha uma mãe idosa e uma filha, na época, ainda pequena. Brincavam sobre a possibilidade de alugar um “quartinho” para que todos ficassem juntos e não corressem o risco de levar o vírus para casa.
Quando questionada em relação a sua vida com a família, Pamela diz que mesmo morando separada da mãe e da filha (que moravam juntas), não deixou de visitá-las. Apesar do medo de ser interpelada pela vigilância nas ruas, continuou realizando as visitas. Chegava em casa do trabalho, tirava a roupa em uma “lavanderiazinha” de sua casa, tomava banho e ia de encontro a sua família. Não tinha “neura” ou cuidado excessivo com compras de mercado, por exemplo, mas tentava ao máximo se proteger. Optou por agir dessa forma no contexto do contato com a mãe e a filha porque um de seus irmãos já morava no Mato Grosso, sendo difícil para sua mãe esse afastamento. Uma das coisas que mais sentiu falta foi a frequência na igreja local que frequentava e a comunhão com as pessoas. Em relação a vida conjugal, refere em tom de brincadeira que o casamento não suportou a Covid, mas que a saúde é o que mais importa.
Voltando ao contexto do trabalho, refere que nunca chegou a faltar EPI para a execução do trabalho porque o uso foi sendo restrito. Quando as vacinas chegaram para a vacinação em massa de Botucatu, o ambiente para vacinação foi alocado em uma das maiores escolas da região e a separação era feita por região eleitoral. A fila era enorme e chegava a dar volta no quarteirão onde o início e o fim da fila quase se encontravam no mesmo ponto. Um profissional era destinado a fazer serviço de “volante” da fila e sua missão era passar pela fila procurando pessoas que tinham prioridade e prestar atendimento às pessoas que vinham a passar mal pelo tempo de espera na fila. A organização do fluxo, quantidade de vacina, quantidade de mesas que aplicariam essas vacinas, número de profissionais e necessidade de voluntariado eram feitos pela gerente da unidade. Pamela participou acompanhando esse processo. Muitos voluntários foram recrutados. Técnicos já aposentados se prontificaram a participar da vacinação em massa:”um aposentado falando “eu quero ajudar, eu vou trabalhar, o que você precisa que eu faça?”. Ao mesmo tempo, alunos em formação do curso de Medicina cedidos por suas universidades chegavam para somar esforços. Pamela relembra que todo esse processo foi, verdadeiramente, uma força tarefa.
Em relação à vacinação, relata dificuldade na imunização das crianças. Antes da pandemia diz já existir grupos que não eram adeptos ao calendário vacinal com a justificativa de não haver necessidade de se vacinar contra doenças já erradicadas. Nesse sentido, pela vacinação ser considerada uma indicação e não um ato obrigatório, a recusa à vacinação não podia ser considerada uma negligência por parte dos pais, e sim um ato facultativo sem implicações. Por isso, ela e seus colegas elaboraram um termo de ciência que foi assinado pelas mães acerca da responsabilidade vacinal dos filhos. Após o contexto da pandemia, esse conceito de recusa vacinal se estendeu um pouco e mesmo vacinas já conhecidas como a da gripe eram recusadas: “a vacina não era mais prioridade para as famílias.” Por isso, Pamela diz que foi necessário o maior incentivo e conscientização da importância das vacinas na vida das crianças. Além disso, refere que a luta na vacinação é uma das pautas de reconstrução da atenção primária atualmente. Por outro lado, as pessoas que não recusaram a vacina queriam escolher a fabricante que mais agradasse, atrapalhando dessa maneira a progressão da imunização. Além disso, não conseguiam entender os critérios que priorizavam os profissionais da saúde e os idosos, por exemplo, queriam escolher o horário e o dia da aplicação; Por isso, para tentar contornar essa situação, foram criadas as salas noturnas de vacinação. Com a utilização delas, o desperdício de vacinas com prazo de validade reduzido após a abertura diminuíram bastante.
Por fim, ao ser perguntada sobre sua experiência pessoal, Pamela reflete sobre as transformações pelas quais passou nos últimos anos. Compartilhou como não se sentia realizada na profissão e como, por vezes, se perguntava se estava seguindo pelo caminho correto. Essas dúvidas se refletiam na relação com a família, onde se apresentava irritada e até um pouco depressiva. Ela descreveu como, em meio a esses questionamentos, acabou se sujeitando a situações de violência relacionadas ao seu marido na época. Apesar do período da pandemia ter sido um momento difícil, foi nele que Pamela se encorajou a perceber o quanto podia ajudar as pessoas e a fortalecer sua autoestima e autoconfiança. Com isso, teve motivação para romper seu relacionamento conjugal e seguir seu caminho sozinha. Todas essas mudanças também refletiram no cuidado com a filha, onde ela sempre reforça a necessidade de estudar e persistir nos objetivos, e no seu sentimento de se sentir capaz: “Isso é uma coisa que eu não sei se falaria antes da pandemia, porque eu não acreditava que eu era capaz.” . Ao final, concluiu que a pandemia trouxe para ela boas experiências e a incentivou a dar novos passos no que tange o próprio conhecimento e o conhecimento profissional.
Roseni - Enfermeira de Família e Comunidade
Roseni é enfermeira em uma Unidade Básica de Saúde na cidade de Botucatu, São Paulo. Ela sempre foi uma mulher muito otimista e por isso tinha fé de que os casos de Covid-19, que estavam surgindo em alguns países do mundo, não chegariam ao Brasil. A situação infelizmente não ocorreu como o esperado. No momento em que, assistindo à televisão, foi informado de que havia pessoas infectadas no Rio de Janeiro e São Paulo, foi tomada por uma enorme preocupação, uma vez que tinha em mente que a Atenção Primária à Saúde Brasileira não teria estruturas para suportar a pandemia.
Na época, Roseni residia com uma de suas filhas e sua mãe de 90 anos. Ela relatou intenso medo de transmitir a doença à mãe devido à ocupação que exercia. Apesar do desejo de não ser infectada, a enfermeira não passou ilesa à situação. Em um de seus atendimentos, recebeu um homem e uma mulher que estavam voltando de uma viagem do exterior. Nessa época, ainda não existia facilidade na realização de testes no SUS, assim, os pacientes tiveram que fazê-los em uma clínica particular. O resultado indicou positivo para mulher, mas ela estava assintomática.
A possibilidade de portar o vírus sem apresentar os sintomas da doença preocupou Roseni e seus colegas de trabalho. Isso porque qualquer um da equipe poderia estar contaminando outras pessoas sem saber. A solução encontrada foi unir um grupo de profissionais para realizar testes de Covid-19. Devido a alta demanda de testes, conseguiram desconto para executá-los. Dos 26 indivíduos analisados, somente Roseni era portadora do vírus e , assim como a paciente que atendeu anteriormente, estava assintomática.
Após a notícia da infecção, Roseni parou as suas atividades laborais e ficou em isolamento social. Ela relata que ficou angustiada com a possibilidade de, em algum momento, começar a apresentar sintomas. “Será que é hoje que eu terei os sintomas?”, questionava-se ela. Felizmente, a situação a qual tinha receio não se concretizou. Sua equipe de trabalho e sua chefe lhes deram muito apoio nesse período, fazendo-se sempre presentes por meio de mensagens e ligações.
De volta ao trabalho, Roseni voltou a integrar o grupo de profissionais de sua Unidade. Os protocolos de combate ao vírus mudavam a todo hora, então, a fim de organizar todas as estratégias de cuidado, as equipes faziam várias reuniões por dia. A partir dos debates, uma das resoluções foi que seria instalada uma tenda na parte externa da clínica para atender os pacientes com sintomas gripais. A enfermeira considera que foi muito importante o apoio do SESMT (Serviços Especializados em Segurança e Medicina do Trabalho) para a concretização do projeto.
Com a progressão da pandemia e com o aumento do número de casos, a situação em que se encontravam os profissionais de saúde era caótica. Havia muito medo de contaminação e de que eles pudessem transmitir a doença para entes queridos. Além disso, era notável a enorme pressão a que as equipes estavam submetidas com tamanha demanda de pacientes. A fim de minimizar a situação, também foi estabelecido que os trabalhadores atuariam em horários corridos, cada grupo em um turno. Isso possibilitou que eles pudessem chegar em casa e se higienizar , sem ter que voltar novamente ao ambiente de trabalho. Para Roseni, tal medida foi muito positiva por diminuir as chances de contaminação e ainda, por conseguir mais tempo para estar com sua família.
Além do carinho que percebeu entre os colegas de trabalho, Roseni também recebeu muito apoio da população. Era grande a preocupação dos profissionais com a falta de Equipamentos de Proteção Individuais (EPIs), tendo isso em vista, a sociedade se organizou voluntariamente para confeccionar máscaras que foram doadas para a clínica. Essas eram utilizadas pelos próprios trabalhadores e também eram oferecidas a pacientes que não tinham condições de arcar com a aquisição de materiais de proteção. Posteriormente a esses atos de generosidade, os profissionais passaram a organizar ações para angariar (EPIs). Obtiveram muito êxito.
Os testes de Covid começaram a chegar no mês de junho de 2020. Nesse momento, cada grupo de profissionais era incumbido de sair às ruas para realizá-los. Durante essa ação, Roseni percebeu que a população também estava com muito medo de contaminação, uma vez que para fazer o teste não permitiam que o examinador entrasse em sua casa. O procedimento muitas vezes era realizado nas calçadas. A enfermeira considera que foi um grande aprendizado lidar com o emocional dos pacientes nesse momento de vulnerabilidade, pois aquelas pessoas estavam precisando de um cuidado que ela tinha condições de oferecer. “Eu preciso ficar de pé. Tem um monte de gente que precisa de mim”, relembra ela.
Outro momento de grande destaque para Roseni foi a chegada das vacinas nas Unidades de Saúde. Havia uma grande ansiedade dos profissionais para tomá-la, mas questões políticas vigentes deixaram o processo mais lento. Após o momento inicial de organização, foi lançado o calendário de imunização, que começou contemplando os idosos. Para que pudessem fazer o procedimento, os profissionais foram vacinados antes de se dirigirem às casas de repouso. Roseni conta que, apesar de estar ciente de que os efeitos imunizantes não eram imediatos, fato lhe causou um enorme alívio.
Mesmo com algum sentimento de esperança, havia ainda entraves para contornar. Ademais, ainda que houvesse muitos indivíduos favoráveis à vacinação, Roseni destaca que, devido também a ideologias políticas, estava observando que muitos indivíduos não queriam realizar a imunização. “Eu tô aqui há 28 anos e eu ainda não tinha visto tanta resistência à vacina”, diz a enfermeira.
Roseni comenta ainda sobre a sobrecarga de atividades da Atenção Secundária no manejo dos casos de Covid. A enfermeira destaca que havia na mídia a disseminação da fala “só venha quando você estiver muito ruim”. Assim, os pacientes já chegavam graves para o atendimento e a função de prevenção e orientação em estágios iniciais da Atenção Primária não era cumprida.
Em seu relato, Roseni também ressalta as mudanças na forma de atendimento com a pandemia. Os residentes, dentistas, enfermeiros, médicos e outros profissionais passaram a realizar muitos teleatendimentos para tentar suprir as demandas dos pacientes que necessitavam de orientações não só relacionadas ao Covid-19. A experiência se mostrou eficaz, uma vez que muitos idosos que possuíam dificuldade de se locomover até a clínica poderiam sanar suas questões de maneira mais prática. Hoje, mantém uma enfermeira ao telefone para prestar assistência à população.
Roseni finaliza a sua entrevista afirmando que a sua atuação na pandemia de Covid-19 foi “uma experiência para vida”. A partir disso, foi possível que ela desenvolvesse ainda mais seu olhar empático sobre o paciente. Mais um saldo positivo da experiência foi o fortalecimento da união entre os membros da equipe profissional. “A equipe ficou muito fortalecida. É um ligando para o outro, mandando mensagem”, conta ela.