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O transplante cardíaco representa uma chance de sobrevivência e melhora na qualidade de vida de pacientes com insuficiência cardíaca terminal. No entanto, viver com um novo coração envolve uma série de mudanças e desafios que afetam não apenas o corpo, mas também as emoções, o cotidiano e os vínculos sociais dos pacientes. Este sumário apresenta os principais temas emergentes das falas de transplantados cardíacos, revelando as nuances da vida após a cirurgia.
A sensação de não ser mais como antes aparece de forma recorrente. As limitações físicas e o receio de forçar o corpo impõem novas rotinas, marcadas por cautela e frustração, assim como relata Mário Luiz.
Mário Luiz: Antes eu era 100%. Hoje não, hoje é 70%. A gente não é como era, um transplante do coração dos outros que botou não é igual. […] Eu antes pegava um botijão daquele de 20 litros, pegava um saco de cimento de 50 quilos, hoje eu não posso fazer isso mais. Vive no limite.
O luto por atividades outrora prazerosas também se manifesta, como nos conta Carlos Henrique:
[Entrevistador: Que coisa boa! E além de andar de cavalo, você gosta de andar de bicicleta também?]
Carlos Henrique: Eu andava.
[Entrevistador: Andava? Aí não tá andando mais não?]
Carlos Henrique: Não.
[Entrevistador: Porquê?]
Carlos Henrique: Posso cair.
[Entrevistador: Ah, tá. Mas você continua sabendo andar, se precisar você anda?]
Carlos Henrique: Não, ando não.
Os medicamentos, essenciais para evitar rejeição, trazem efeitos colaterais importantes como nefrotoxicidade, desregulação da pressão arterial e surgimento de novas doenças. Assim como dizem Duarte e Erianderson.
Duarte: Aí me veio plaqueta baixa, pneumonia, bactéria no sangue. Mas, graças a Deus, hoje, teve também um início de rejeição, foi feita a biópsia do rim e feita a biópsia renal. Aí teve início rejeição e tomei um medicamento que os médicos esperavam voltar novamente a urinar. Mas não voltou. Mas, em compensação eles pediram outra biópsia e a outra biópsia deu zero rejeição.
Erianderson: Tô sim, tô. Tenho o que reclamar não. Vivo bem. Faço o que eu quero. Às vezes faço até o que não posso. Como tudo que vem na minha frente. Porque é assim, depois da minha... desse, desse transplante, eu adquiri a diabetes.
A adaptação à medicação também exige vigilância constante, o que pode causar dificuldades na adaptação. Tal qual foi relatado por José Antônio:
José Antônio: Fiquei três dias sem tomar remédio […] erro meu. Se eu tivesse sem remédio, vinha aqui. […] Aí passei por uma biópsia.
Apesar da melhora clínica, o retorno ao trabalho é dificultado por limitações físicas, discriminação e barreiras burocráticas. Elindinaldo e Silvânio expõem algumas dificuldades em trabalhar:
Elindinaldo: Questão de saúde eu tô bem melhor. Mas financeira… Financeira eu fiquei um pouco triste, né, assim na questão de trabalho. […] Tem que concorrer à vaga na parte de deficiência. Aí alega que o quadro tá completo.
Silvânio: Trabalhei 22 anos. […] Mas se eu for me esforçar, amanhã ou depois eu tô aqui. Aí é melhor eu tá em casa, cuidando de mim mesmo.
O convívio social se torna mais seletivo, muitas vezes restrito ao ambiente doméstico ou pequenas viagens. Por vezes, há uma mudança na relação com o lazer e com o próprio corpo, relatada por Mário Luiz e Oswaldo:
Mário Luiz: Hoje eu não tenho paciência nem pra tá escutando música, quanto mais tá no meio do mundo.
Oswaldo: Vou a passeio... Passo um dia ou dois. Não posso passar muito tempo também, por causa da hemodiálise.
As transformações também ocorrem no plano subjetivo. O paciente, tendo os relatos de José Delson e Mário Luiz como exemplos, se reconhece como alguém alterado, com novos limites e modos de viver.
José Delson: Ô doutor, eu já era um pouco agitado. Agora, se eu me altero, procuro ir pra casa e ficar sossegado.
Mário Luiz: A gente vive no risco, vive no limite.
A experiência após o transplante cardíaco, embora marcada por gratidão e esperança, também revela um cotidiano permeado por restrições, vigilância, adaptações e novas formas de viver. Os relatos apresentados evidenciam a necessidade de um acompanhamento multiprofissional contínuo, que considere os aspectos físicos, emocionais, sociais e econômicos da vida dos transplantados.