Recursos e Informações – Profissionais no cuidado

A aba Recursos e Informações tem por objetivo ser uma fonte de informação confiável e acessível para a população brasileira sobre a hanseníase: sua transmissão, seus sintomas, seu diagnóstico, seu tratamento e outros aspectos. A maioria das informações dispostas a seguir foi consultada no site do Ministério da Saúde, órgão que centraliza os dados sobre hanseníase no nosso país. Você pode acessá-lo para se aprofundar no assunto. Começaremos o texto com um vídeo curto que nos introduz informações importantes sobre a doença.

1. Introdução e Contextualização Histórica

Hanseníase: Conheça, Previna, Identifique e Trate

 

Como pudemos aprender, a hanseníase é uma doença causada por uma bactéria de nome Mycobacterium leprae. Ela atinge principalmente a pele, os nervos da pele e nervos periféricos, causando manchas e alterações na sensibilidade. Pode, também, causar prejuízo nas funções da mão, dos pés, incluindo mobilidade, dentre outros sintomas. Trata-se de uma das doenças mais antigas da humanidade, com registros datando de mais de 2600 anos atrás, em locais da Ásia e da África. É uma infecção que acomete tanto homens quanto mulheres, e pode acontecer em qualquer idade. O Brasil é o 2o país do mundo em número de casos novos de hanseníase, e a doença permanece até os dias de hoje como um problema de saúde pública e um desafio na nossa sociedade. 

Ao longo dos séculos, a hanseníase despertou receios e preconceitos. Diversos fatores contribuíram para esse contexto, como a ausência de um tratamento eficaz, o desconhecimento da causa e do modo de transmissão, o mito de que a doença poderia ser um "castigo divino" e as deformidades que ela podia causar. O isolamento dos doentes era uma resposta a essa realidade que era marcada, em essência, por falta de informação e preconceito. Diversos hospitais-colônia que existiram no território brasileiro tinham como função abrigar as pessoas acometidas por hanseníase, que eram retiradas do convívio social e internadas compulsoriamente. Na época, este processo era justificado como estratégia sanitária de controle da doença, mas também evidenciava o estigma existente naquele período. 

Hospital Colônia de Curupaiti, fundado em Jacarepaguá, Rio de Janeiro, em 1928. Foi um dos maiores abrigos de pacientes acometidos por hanseníase do Brasil. A participante Maria da Saúde nos conta em sua entrevista sobre sua experiência quando lá foi internada por 3 meses, em 1993.

Fonte da foto: Casa de Oswaldo Cruz

A partir da década de 1980, após avanços na ciência, esclarecimentos sobre a origem e a causa da doença, a chegada de medicamentos eficazes no Brasil e a introdução de uma abordagem humanizada no cuidado, ocorreu uma mudança na estratégia de tratamento das pessoas acometidas pela hanseníase. A grande inovação foi a introdução da PQT na década de 80, um esquema de antibióticos que elimina a bactéria causadora da hanseníase. Daí em diante, ocorreu o fechamento dos hospitais-colônia, e o início de uma nova forma de tratar a hanseníase. Em 1995, a Lei no 9.010 instituiu que o termo "lepra" e seus derivados não podiam mais ser empregados em documentos oficiais. A substituição para o termo "hanseníase" permanece, até os dias de hoje, uma decisão tomada exclusivamente no Brasil. Este foi um importante passo para um processo de ressignificação social e quebra de antigos paradigmas da doença em nosso país, processo este que está em curso até os dias de hoje. 

É preciso ter em mente que a hanseníase é uma doença negligenciada. Isso significa dizer que o seu estudo recebe poucos investimentos para o desenvolvimento de novas formas de tratamento e de controle, apesar de permanecer como um problema de saúde pública em diversas regiões do mundo. A falta de pesquisa em hanseníase ocorre porque ela é uma doença que afeta populações de países em desenvolvimento marcados por aglomerados urbanos. Dessa forma, a população acometida pela hanseníase não gera o retorno financeiro para as grandes empresas da indústria farmacêutica que, invariavelmente, são o grande motor das inovações da medicina.

Saber que a hanseníase é uma doença negligenciada é importante para que possamos valorizar o papel dos órgãos públicos brasileiros na implementação de estratégias de controle e de tratamento da doença. É importante, também, para que possamos advogar a favor da continuidade destas políticas públicas, de modo que cada vez mais outros avanços se concretizem para melhorar o cuidado da nossa população.

2. Principais Sintomas e Manifestações da Hanseníase

Em sua página sobre hanseníase, a Sociedade Brasileira de Medicina de Família e Comunidade nos explica como a hanseníase afeta os nervos e como há a manifestação de seus sintomas: 

"Assim como os fios elétricos passam por dentro das paredes das casas, os nervos são como fios que passam dentro do corpo e permitem sentir frio, calor, dor e tato. Se o fio elétrico estiver ruim, os aparelhos não funcionam, a luz não funciona. Se os nervos não estiverem bons, não sentiremos as coisas que nos tocam ou não nos movimentaremos bem, como mexer a mão ou andar. Os nervos mais afetados podem ser palpados [...], porque podem ficar engrossados e em geral dolorosos." 

Conhecendo como a bactéria que causa hanseníase age nos nervos, podemos entender os principais sintomas da doença, segundo o Ministério da Saúde:

  • Manchas (brancas, avermelhadas ou amarronzadas) com alteração da sensibilidade, podendo ser térmica (perda da sensação de calor ou frio), dolorosa (perda da sensação de dor) e/ou tátil (perda da sensibilidade ao toque).
  • Comprometimento de nervos periféricos, que manifestam-se com espessamento (engrossamento) dos nervos e alterações na sensibilidade, força e/ou na movimentação, principalmente de braços e pernas.
  • Presença de áreas de pele com diminuição dos pêlos ou do suor.
  • Sensação de formigamento e/ou fisgadas, principalmente em mãos e pés.
  • Nódulos (caroços) no corpo, em alguns casos avermelhados e dolorosos. Estes nódulos são manifestações do que conhecemos como reações hansênicas.

Observe seu corpo! Separamos algumas fotos do Novo Atlas de Hanseníase, também disponível no site do Ministério da Saúde, para exemplificar alguns sintomas da hanseníase.

Nas fotos acima, observamos manchas que estão presentes em diferentes locais do corpo. Note que elas podem ter diferentes cores. Uma característica muito importante da mancha causada pela hanseníase é a alteração da sensibilidade na área afetada, seja à temperatura, à dor ou ao toque.

As duas primeiras fotos correspondem a pacientes com manchas únicas, em rosto (à esquerda) e em braço (ao centro). São exemplos do que conhecemos como hanseníase paucibacilar (hanseníase PB), isto é, a forma clínica da doença referente a pessoas com poucos bacilos, que apresentam até 5 manchas. Já o paciente da foto da direita é um exemplo do que conhecemos como hanseníase multibacilar (hanseníase MB), já que notamos a presença de mais de 6 manchas. O comprometimento dos nervos também caracteriza a hanseníase multibacilar. A diferenciação entre hanseníase paucibacilar e multibacilar é importante porque define a duração do tratamento, como está descrito a seguir.

O participante Matheus nos conta como foi o seu caminho até o diagnóstico, um exemplo da forma clínica da hanseníase paucibacilar: ele tinha apenas uma mancha no braço. Já a participante Ermelinda narra a presença de várias manchas pelo seu corpo, principalmente em pernas, e a perda de força e mobilidade de sua mão. Corresponde, portanto, a um caso característico de hanseníase multibacilar.

Já nas fotos acima, observamos as alterações próprias dos nervos. À esquerda, a mão em garra, quando os dedos das mãos ficam curvos com o aspecto semelhante a uma "garra"; ao centro, a presença de cicatrizes no braço devido a lesões decorrentes da perda de sensibilidade; e, à direita, o espessamento dos nervos na região do pescoço.

A mão em garra, o pé caído, a perda de sensibilidade, a perda de força, a queda de pêlos, o ressecamento da pele e muitos outras alterações constituem o que chamamos de sequelas da hanseníase. As sequelas são uma importante causa de incapacidade e limitações associadas à doença, porque muitas vezes não desaparecem depois do tratamento com antibióticos. No entanto, outras abordagens, como fisioterapia ou cirurgias, podem ser úteis para o tratamento nesses casos. Vale ressaltar: quanto antes o tratamento for realizado, menor as chances do desenvolvimento de sequelas.

No vídeo em que nos conta sobre suas limitações cotidianas, o participante Izaías nos mostra uma sequela da hanseníase: sua mão em garra. Ele nos diz que está fazendo sessões de fisioterapia, mas aguarda a correção cirúrgica para melhorar a mobilidade e, assim, reduzir suas dificuldades no dia a dia.

As fotos acima foram tiradas de pacientes que desenvolveram as reações hansênicas. À esquerda, observamos áreas da pele elevadas, avermelhadas e dolorosas, principalmente em mãos, dedos e braços. Já na foto da direita, notamos manchas vermelhas e nódulos (caroços) na pele, principalmente nos braços. Na maioria das vezes, as reações hansênicas não se manifestam apenas na pele, mas são frequentemente acompanhadas de outros sintomas como febre, mal estar e alterações motoras e sensitivas de início rápido.

Em um momento em que se emociona, a participante Eliane nos relata as características de suas reações hansênicas, que causam "caroços" por todo corpo. Segundo ela, é justamente a persistência das reações que a faz duvidar da concepção de "cura" que abordaremos a seguir no item 5. Tratamento.

3. Transmissão da Hanseníase

A transmissão ocorre pelo ar, através do contato com a bactéria liberada em espirros ou tosse, por exemplo. Um aspecto essencial é entender que não há mais liberação da bactéria pelo paciente que inicia o tratamento. Em outras palavras, a partir do início do tratamento, não há mais risco de transmissão. Também sabemos que é necessário um longo período de exposição à bactéria para ocorrer a transmissão (por vezes, vários anos), e apenas uma pequena parcela das pessoas expostas realmente adoece.

Cabe ainda ressaltar que nem todos os indivíduos com hanseníase transmitem a doença, já que a forma paucibacilar da hanseníase não é contagiosa. Por outro lado, os indivíduos acometidos por hanseníase em sua forma multibacilar constituem o grupo contagiante, e são a fonte de infecção enquanto não iniciarem o tratamento.

No tema Contágio, podemos conhecer diversos relatos que ilustram a transmissão da hanseníase.

4. Diagnóstico de Hanseníase

O diagnóstico da hanseníase é realizado através do exame médico. O médico ou médica identifica áreas da pele com alteração de cor e/ou sensibilidade; identifica, também, o comprometimento dos nervos, que se manifesta principalmente através de perda de sensibilidade, de força ou da movimentação.

Nos casos em que há suspeita da hanseníase por comprometimento dos nervos, mas não existem manchas ou alterações de pele, a equipe médica deve encaminhar o paciente para unidades de saúde de maior complexidade. Nessas unidades, pode ser necessário a coleta de material para outros exames (baciloscopia ou biópsia) e de exames eletroneurofisiológicos que procuram identificar o comprometimento dos nervos.

Após o diagnóstico, o paciente tem direito a receber a Caderneta de Saúde da Pessoa Acometida Pela Hanseníase. A Caderneta foi elaborada pelo Ministério da Saúde, e é um instrumento de uso conjunto do profissional e do paciente, cuja função principal é o registro do tratamento. Nela, estão presentes também orientações sobre a doença, sobre os direitos da pessoa acometida por hanseníase e os cuidados associados à doença.

5. Tratamento da Hanseníase

O tratamento da hanseníase é direito de todo cidadão, sendo disponibilizado pelo Sistema Único de Saúde (SUS) nas unidades básicas de saúde e, caso seja necessário, em outros centros de referência.

A maioria das pessoas acometidas por hanseníase realizam o tratamento na unidade básica de saúde com a poliquimioterapia (PQT). Trata-se da combinação de três antibióticos (rifampicina, dapsona e clofazimina). A duração do tratamento varia conforme a forma clínica da hanseníase. Para a hanseníase paucibacilar, é preconizado o tratamento durante 6 meses, enquanto que para a hanseníase multibacilar, o preconizado é de 12 meses. Os comprimidos devem ser tomados todos os dias em casa e uma vez por mês nas unidades básicas de saúde, no dia das consultas com o médico ou médica assistente. Ainda no início do tratamento com a poliquimioterapia, não há mais transmissão da doença. Fazer o tratamento, portanto, é benéfico para o indivíduo acometido pela doença, pois evita o desenvolvimento de complicações, mas é essencial também para o coletivo, já que interrompe a cadeia de transmissão da doença.

As fotos acima ilustram as cartelas de poliquimioterapia disponíveis nas unidades básicas de saúde. A cartela é a mesma tanto para pacientes paucibacilares como multibacilare, à esquerda, para adultos, e à direita, para crianças. Na parte de cima de cada cartela, estão os remédios que o paciente deve tomar de forma supervisionada, durante as consultas com o médico ou médica assistente. Já na parte de baixo, há os comprimidos de uso diário. A poliquimioterapia e os demais tratamentos da hanseníase constituem direitos de todo cidadão brasileiro.

Fonte das fotos: documento Hanseníase na Atenção Básica.

Com a PQT, ocorre a eliminação da bactéria de forma definitiva. Entretanto, como a hanseníase pode estar associada a sequelas que não desaparecem com o tratamento antibiótico, a concepção de "cura" pode ser questionada, principalmente pelos que têm a experiência do adoecimento. "Quem tem hanseníase é quem sabe disso": é o que Josefa, participante do projeto, nos diz quando discorda da ideia de cura para a hanseníase. Ela acredita que a doença fica "amortecida" com o tratamento, mas não é eliminada. Já o participante José Alves diz estar ciente de que está curado, mas a hanseníase deixou sequelas "por onde passou". Para ele, muitas pessoas não conseguem diferenciar a hanseníase de suas sequelas, sendo uma confusão comum dentre outros pacientes que conhece. Esse debate é interessante e está contemplado no tema A Cura deste WebSite.

Em certos casos, como quando ocorrem reações hansênicas, deformidades, perda de força ou restrição de movimentos, será necessário encaminhamento para Centros de Referência em hanseníase. Nesse ambiente, outras formas de terapia podem ser utilizadas, como a utilização de outros medicamentos, encaminhamento para fisioterapia ou cirurgias e outras modalidades de tratamento.

6. Estigma e Discriminação

Segundo o livreto Hanseníase: Conhecendo estigma, discriminação e os direitos das pessoas acometidas pelahanseníase, o estigma da hanseníase se desenvolveu ao longo de muitos anos marcados por mitos e supertições que determinavam discriminação e exclusão social das pessoas acometidas pela hanseníase. A origem desse estigma era, sobretudo, pelas crenças da população em uma época em que não havia tratamento e não se conhecia a forma de transmissão da doença.

Hoje em dia, a falta de conhecimento sobre a doença, sua transmissão e seu tratamento permanecem sendo o principal motivo de estigma e discriminação, o que é dito inclusive por muitos dos nossos participantes. Essas situações podem estar presentes em diversos âmbitos da vida da pessoa acometida pela hanseníase, como na família, na escola, no trabalho e até mesmo nos serviços de saúde. Você pode conhecer a vivência dos nossos participantes frente ao estigma social no tema Percebendo o Preconceito. Como o preconceito surge principalmente da falta de conhecimento, a principal forma de enfrentá-lo é a disseminação de informações confiáveis sobre a doença e sobre a experiência de adoecimento e tratamento, um dos principais propósitos deste WebSite, e também um dos principais motivos para a participação de vários pacientes neste projeto.

A participante Marizélia nos diz que através da conscientização, a população pode "passar a ver com os olhos de um profissional da saúde": reconhecer a hanseníase em seus sinais e sintomas e favorecer o diagnóstico precoce. Além disso, reconhece que a população esclarecida sobre a doença e suas perspectivas de tratamento estariam menos sensíveis

Desde 1986, o Movimento de Reintegração das Pessoas Atingidas Pela Hanseníase (Morhan), atua na disseminação de informações gerais sobre a hanseníase, seus sintomas e seu tratamento. Trata-se de uma entidade sem fundos lucrativos que reconhece a importância da conscientização da população como transformação da realidade da doença no país. Por isso, o movimento tem como foco de trabalho atividades de conscientização, além de lutar pela garantia dos Direitos Humanos e defender a criação de políticas públicas eficazes para a população acometida pela hanseníase.

Atenção: existem dispositivos que atuam na defesa da pessoa acometida pela hanseníase. Caso tenha ocorrido alguma atitude discriminatória, você pode ligar para o Disque Saúde 136 ou acessar o Observatório Nacional de Direitos Humanos e Hanseníase.

7. Comentários Finais

Com objetivo de reforçar as principais informações sobre a hanseníase, seus sintomas, diagnóstico e tratamento, indicamos que assista ao vídeo em que o então coordenador do Departamento de Hanseníase da Sociedade Brasileira de Dermatologia, Egon Daxbacher, explora estes conhecimentos em 7 perguntas.

Hanseníase em 7 Perguntas

 

Por fim, o livreto produzido pelo Ministério da Saúde (Hanseníase, conhecer para não discriminar) sintetiza as principais informações sobre a doença, e está facilmente disponível na Internet. Acesse, também, o Spotify para ouvir Podcasts com informações complementares a este texto.