A espiritualidade e/ou a fé religiosa podem ser recursos positivos de enfrentamento, utilizado pelos pacientes e suas famílias para lidarem com situações complexas e graves de adoecimento por covid-19, seja no sistema público ou privado de saúde. Alcione (novembro de 2020), médico atuante na linha de frente da pandemia, internou-se no sistema público e compartilha sua relação com a espiritualidade e como pode ser uma forma de se alcançar tranquilidade e esperança diante de uma situação crítica:
“É que a gente está num momento ali em que a gente não tem expectativa, que não tem certeza de nada, que a vida pode acabar a qualquer momento ali. Por exemplo, tive momentos em que a minha mente estava ótima e eu sabia que eu tinha um exame que tinha 80% de lesão e eu sabia que eu já tinha perdido muitos pacientes por isso, por complicação. E eu pensava: ‘Nossa, minhas chances estão diminuindo muito, né?’. E é muito ruim. Você está com a mente muito boa, sã, num corpo que naquele momento está ruim, está com muitos problemas. Então você fica sem perspectiva, assim, preocupado: ‘Ah, posso perder minha vida a qualquer momento, mas posso ter uma piora e então falecer’. E você então ter qualquer coisa que faça com que você tenha alguma esperança, contribui muito. Então, às vezes você pode confiar que ao fazer uma oração, fazer uma oração, e aquilo ali te tranquiliza, que você faz uma reflexão, você pede por ajuda e aquilo traz algum conforto para você naquele momento em que você está aflito, ajuda muito. Às vezes você está sozinho, não tem ninguém”.
Outros participantes também compartilharam sua relação com a espiritualidade, vinculada ou não à fé religiosa. Nesse sentido, os pacientes se sentiram acolhidos e encorajados a lutarem pela vida, sabendo que existe algo maior que está à frente da situação, como por exemplo, Viviane, evangélica, adoeceu em maio de 2020, pensou em desistir mas buscou na oração força em Deus para enfrentar a gravidade da sua doença: “[...] Eu comecei a orar em pensamento e a pedir, aí até chegou o momento de eu falar, falei, ‘Senhor, eu não tô mais aguentando se eu se tiver que me levar, o Senhor pode me levar, mas eu não aguento mais"'. Concelita (maio de 2020), católica, também pediu a Deus em oração força no enfrentamento da covid-19: ‘Ah, eu sou católica e todas as orações para mim eu usei todas. Todas que me vinha na mente eu rezava, eu fazia. Eu pedia a Deus’. Carlos Eduardo (agosto de 2020), também católico, “orava todos os dias”. Todos os 3 entrevistados foram hospitalizados no sistema público de saúde.
“Eu hoje fico pensando, meu Deus, como, acho que Deus me deu uma anestesia, não sei o que que aconteceu comigo pra eu ter tido a tranquilidade que eu tive de ficar esses 29 dias aqui dentro do hospital sem me desesperar. Às vezes vinha assim uma coisa de eu ficar ansiosa, eu falei ‘não, meu Deus, eu não posso ficar que vai me prejudicar, eu tenho que ficar mais firme, eu não posso me deixar, me entregar’”. Janilda, técnica de enfermagem, adoeceu em maio de 2020. Ao longo da sua narrativa traz a espiritualidade como algo essencial na sua cura.
Margareth, permaneceu internada por 10 dias no sistema privado, em agosto de 2020 e também teve que lidar com seu marido gravemente hospitalizado por covid-19 no mesmo período. Evangélica, também usou a oração como ferramenta para buscar conforto diante do sentimento de solidão ao longo do seu adoecimento.
“Mas então assim, esse distanciamento que você se sente na obrigação de ficar longe das pessoas por um cuidado com elas, é uma solidão invisível, muito invisível, você não percebe que você mesmo é obrigado a dizer: ‘você vai passar por isso sozinha, mesmo com todo o cuidado da medicina, mas é um mal que você tem que passar sozinha’, inconscientemente, isto vai trazendo um buraco dentro de você, e foi exatamente isso que eu senti, mas Deus foi muito gracioso eu percebi o cuidado dele comigo ali dentro do hospital, a presença de Deus comigo naquele quarto foi indescritível, foi ali que eu tomei consciência de que eu estava além do vírus, eu estava com um mal muito grande que era a solidão, foi ai quando eu chamei por Deus e falei senhor passa por esse trajeto comigo me faça sentir a presença do senhor porque sozinha eu não consigo, então por isso que eu atribuo a Deus a minha vida toda, a nossa vitória ai’.
Além da Margareth, Maria Verônica, que adoeceu logo no começo da pandemia, em abril de 2020, quando pouco se sabia da doença, ao seu conectar com a sua fé religiosa encontrou uma forma de lidar com os seus sentimentos, principalmente de desamparo:
“Eu lembro que eu me vi sozinha no quarto em um leito sem acompanhante, sem nada só a equipe de enfermagem entrando com todo aquele equipamento, né? De segurança que eles usam. E o que eu senti que eu não estava abandonada, porque como eu confio muito em Deus e tem 2 pessoas que já faleceram que eu acho que estão sempre tomando conta de mim, por coincidência, eu lembro que na parede do meu quarto tinha 2 cruzes, é um hospital católico de freiras, mas tem uma cruz no quarto, tudo bem, mas 2 eu achei estranho demais, assim eram cruz sem corpo quando eu olhei essas cruzes sem corpo, eu imaginei 2 figuras ali falecidas que eu amava muito meu pai e meu sobrinho. Então quando me vi ali sozinha na iminência de poder estar com covid eu me agarrei a essas 2 pessoas que não estão mais aqui pedindo a proteção deles junto a Deus que tudo pudesse sair bem”.
Além delas, André foi internado em estado grave em abril de 2021, fala que sua recuperação foi um milagre diante de suas comorbidades, sendo uma delas a obesidade:
“O pessoal fala até 'rapaz, você tocou na mão de Jesus e voltou, porque muitos, muitos chegaram aqui com a situação melhor do que a sua e não saiu'. Teve pessoas graves que chegaram lá e não saíram, sabem, foi um negócio de, foi Deus mesmo, foi Deus, não tem pra onde correr não. E os médicos que trataram, não vou tirar os méritos dos médicos não, porque Deus que guiou a mão dos médicos pra poder me curar, porque não tinha outra, o caso era de morte, chegar lá, intubar e pedi a Deus que voltasse, eu conheço pessoas que voltaram. Entubaram e ficaram curadas, entendeu. Além de ter problemas na traqueia, tem problemas em todo o, então o meu, dos males, é o menor, eu posso dizer.”
O confronto com a morte foi algo frequentemente comentado pelos entrevistados e causa sentimentos como ansiedade e angústia. A ligação com a religião foi importante diante desse cenário, Henrique (março de 2021) ficou gravemente doente:
“Eu creio e amo o Senhor Jesus Cristo. Eu creio que nada foi por acaso que aconteceu. Eu sei de toda a parte fisiológica, biológica, tudo disso eu sei, mas eu sei que também na parte espiritual foi Ele que não deixou eu ir, não, porque no estado em que eu fiquei, os médicos mesmo falam assim: ‘você é um caso fora da curva, era para ter morrido’. Não, não foi normal eu ter sobrevivido aquilo não. Então eu creio nisso, para mim é tranquilo. Eu acho que por isso eu não tinha medo de morrer. Eu sabia que a minha situação, vivo ou morto, seria boa no final. Então eu não tenho esse medo”.
Francisco, católico, adoeceu em fevereiro de 2021, permaneceu 12 dias hospitalizado no sistema privado de saúde:
"Na quinta-feira pela manhã ele [o médico] falou comigo que estava me achando muito agitado, achava melhor me entubar, ‘se você acha que é melhor pra mim, vamos em frente’. E como eu estava em um ambiente médico, eu sou muito católico assim, não externei isso a ele, mas cá comigo eu sabia que Nossa Senhora estava comigo, que ela faria o melhor, se fosse para eu sobreviver, eu sobreviveria, se fosse pra eu estar do lado dela e do pai eu estaria do lado dela e do pai. Então, eu dei essa resposta: ‘olha o que você achar que é melhor pra mim faça’.”
E ele completa:
“Eu não sei, acho que os doentes, a senhora não me perguntou isso, mas eu acho que os doentes graves tem fé, não sei se eles têm alguma facilidade para lidar, não só com a recuperação, como a própria morte, e eu me senti assim naqueles dois primeiros dias, que não estava completamente consciente, mas também não estava completamente inconsciente, eu me sentia reconfortado pela minha espiritualidade, mas assim, pra pessoa receber isso bem, ela também tem que sentir a mesma coisa que eu. Tem que ter fé, se não ela não vai sentir isso, eu achei muito importante eu ter fé. Eu aceitei aquele estágio que eu me encontrava de forma tranquila.”
Para Bárbara, (setembro de 2021) a possibilidade da morte lhe apavorava, e diante de todo o cenário de guerra que estava vivenciando, temia seu prognóstico e sentia medo de cansar de pedir a Deus pra sobreviver, pois só ele poderia ajudá-la:
“Muito, muito, muito, muito, muito medo. Eu falo muito, vou meter a questão da espiritualidade no meio de novo, falo muito que por ser uma pessoa que tem uma vida muito boa, eu costumava não pedir muita coisa a Deus. 'Ai gente, vou ficar aperreando Deus com minhas coisas não, se der deu, o que não der não deu, o que ele mandar tá bom, o que não mandar também tá bom também.' E aí, eu lembro que antes de ir pra UTI, eu olhei pra minha irmã e falei assim 'E se eu me cansar de pedir a Deus pra tá viva'. Eu lembro nitidamente que eu falei isso, porque eu pensei menina olha 'Já tive uma vida tão boa, tanta gente que pode ser fundamental na vida dos outros, vou ficar lá aperreando, vai que Deus diz 'Não minha fia, você tem que vim'. [Risos de descontração] Eu lembro que isso era uma preocupação, não pedir mais pra Deus pra voltar, tá entendendo?! Não sei se tá tendo lógica, mas esse era o medo. Talvez por querer ser atendida, e vai que ele não me atendia, e eu ia ficar frustrada ?!. Mas, eu senti medo, muito medo, senti medo de cansar de respirar, é isso quando você está tentando respirar, você se cansa muito, você se cansa literalmente, e eu tinha medo de cansar de pedir para estar ali, de sair dali, na verdade, esse era o medo. Eu nem sei dizer, se esse era um medo de morrer especificamente, mas era como se sentisse que eu tinha que pedir pra sair dali, então eu sentia muito medo.”
Alguns entrevistados trazem de forma particular as diversas vivências e possibilidades de conexão com o Divino ao longo da internação. Para Reneé (outubro de 2020), espírita que permaneceu 82 dias hospitalizado, a religiosidade “fez muita diferença”. Márcia Cristina, técnica de enfermagem, adoeceu em junho de 2020 e nos conta: “Sou do candomblé. Acredito muito em Deus também. Mas assim. Na hora eu acho que você se apega a tudo o que você acredita, tudo o que você traz com você”. Sérgio, pai de Márcia Cristina, adoeceu em novembro de 2020 e também nos contou sobre sua ligação com a religião. Ambos foram internados no Hospital Clementino Fraga Filho.
“Olha, eu sou evangélico, eu não quero ficar jogando pedra em cima de uma religião ou de outra, até porque eu acredito, eu acredito não, eu respeito todas, entendeu? Então, eu não posso falar assim ‘ah, porque eu sou evangélico e tal’, porque teve católico que me atendeu, teve, teve espírita que me atendeu. Então, eu coloco só na mão de Deus, porque todos são filhos de Deus. Então, eu sou evangélico, tenho crença no que eu prego, no que eu vivo, mas eu tenho consciência de que não foi só pelo evangelho, foi por todos. Então, eu faço um apanhado com todos e assim eu sou grato a todos, ao macumbeiro, ao espírita, ao católico, ao budista, todos, todos que me ajudaram, porque cada um tem a sua religião e merece respeito”.
Julio, adoeceu em março de 2021 e permaneceu 23 dias internado no sistema privado de saúde. Umbandista, compartilha que ao longo da sua intubação teve “delírios com relação à Umbanda, um delírio de imagens", e que sua mãe de santo intercede por ele ao longo do seu período entubado. “Então depois que eu saí, eu fui à igreja agradecer. Fui pagar algumas promessas que minha esposa fez, eu tenho mais duas promessas para pagar junto com as pessoas”. Ele também conta sobre o período lúcido e acordado nessa internação:
“Na televisão no hospital, eu passava no canal. Eu vi um altar e eu deixei ali. A enfermeira vem perguntar: ‘o senhor gosta? O senhor é religioso’. Eu falei: ‘sou’. Aí ela me explicou que no hospital que eu fiquei tem uma capela e tem uma câmera que fica de frente para o altar nessa capela que fica filmando direto e passa na televisão. Eu deixava lá, com a música e eu ficava no altar da capela na televisão que não tirava de lá. Foi a única questão de religião que durante essa situação toda, eu tive presente, mas eu não rezei. Eu não chamei pelos meus guias, entendeu?”.
Eduardo, adoeceu em março de 2021 e permaneceu por 10 dias internado no sistema privado de saúde. Faz menção sobre a importância da espiritualidade no paciente grave, principalmente ele, que como médico, teve resistência no papel de paciente e certa dificuldade em ser cuidado: “E como te falei a primeira coisa que eu fiz foi: ‘Senhor está nas suas mãos’. A espiritualidade me ajudou naquele momento de aceitação da minha condição como paciente, para me permitir ser cuidado pela equipe”.
A espiritualidade pode auxiliar no conforto do paciente internado. Diante de uma situação limitante e angustiante, além da oração, louvores e canções ajudam no enfrentamento do adoecimento. Eduardo completa: “E aí, teve um momento que a Bruna recebia alguns louvores, algumas coisas assim, e ela me passava. Eu ficava ouvindo essas músicas na UTI, e isso para mim foi muito terapêutico”. Ademir, que adoeceu em abril de 2020 e permaneceu hospitalizado no sistema público de saúde, compartilha sobre sua ansiedade logo nos primeiros sintomas da doença e o conforto que encontrou nas músicas do Padre Fábio de Melo
“Ah, eu acredito muito em Jesus. É como eu te falei, eu quando… antes de eu me internar, eu não conseguia dormir. Eu estava com medo até de morrer, me deu assim eu nunca fui de sentir nada no coração, não sei nem te dizer como é que era, me deu umas palpitações [...]. Da sexta pro sábado, eu fui internado no sábado. Eu fiquei ouvindo o Padre Fábio de Melo, as músicas. Aí eu acho que eu cochilei lá pras cinco horas da manhã. Seis horas eu levantei, seis e pouca. De quatro e pouco pra cinco da manhã, talvez eu tenha cochilado. E umas seis e pouca, sete horas. ‘Ah, eu vou me internar’. Eu não estava bem essa noite”.
Bárbara, que ficou internada em maio de 2022, considera que a sua conexão com Deus, e orações que lhe foram direcionadas fizeram ela voltar a vida de certa forma, muitos amigos e familiares tiveram sonhos com ela, ela comenta com alegria que se concretizaram:
“...fiquei feliz, né? Porque o pessoal tava pedindo por mim, tava tendo muita gente pedindo pela minha vida e isso tem efeito. Corrente de oração, correntes... aquelas pessoas pedindo, tendo o mesmo pensamento, isso dá um efeito, isso flui e acontece, porque é fé. Fé é o que você nem tá vendo, mas você tá acreditando “ela vai ficar boa, vai ficar boa...”, eu tenho uma colega minha disse: ‘eu tinha certeza que você ia voltar porque eu sonhei com você tomando café na minha casa’ aí eu disse: ‘é, ela vai voltar’, aí eu disse: ‘é...’ e foi como ela sonhou, voltei, né?”
A palavra “fé” foi usada diversas vezes pelos entrevistados, sendo associada a busca por um sentido e significado para aquela experiência potencialmente fatal. Paula adoeceu em junho de 2020 e teve uma internação bem complicada, chegando a desacreditar da vida, mas a fé se tornou um suporte para enfrentar essa situação grave:
“No primeiro momento, eu pedia muito para ficar, para que Deus me desse uma chance, que Deus me ajudasse que eu queria ver a minha filha e quando eu vi que foi piorando, percebi que eu estava piorando porque eu não me mexia mais como antes, eu vomitava muito e ali também, mesmo não querendo morrer, mas por conta da minha fé e eu acreditava que, se era isso que Deus tinha como meu plano de vida, que eu aceitava”.
Juliana, enfermeira, adoeceu em março de 2021 e interna-se no sistema privado de saúde no mesmo período que seu pai, não vivendo apenas a angústia de paciente, mas também de familiar:
“Olha, eu sou umbandista, mas na verdade eu acredito que todas as religiões me levam a Deus, tudo o que for bom, para o bem me leva a Deus. Então assim, todos os dias, todos os dias mesmo, eu rezo o terço, escuto o padre Marcelo Rossi. Sou devota de Nossa Senhora Aparecida e São Sebastião, e até escolhi o dia da minha filha nascer, no dia 12 de outubro, porque era dia de Nossa Senhora, minha maior graça da vida é ela e assim eu rezo muito. Sou uma pessoa que tem uma fé muito grande. E mesmo com tudo que você possa imaginar, o papai teve tudo, tudo de errado, tudo de ruim e mesmo assim eu me mantive firme na fé. Sou muito, muito, muito apegada ao lado espiritual e à religião porque eu acredito assim, que a fé é muito além do que é uma religião. Você tem que crer que existe algo melhor, não interessa se o seu Deus não é o mesmo que o meu. Eu respeito e acredito se te faz bem, é um Deus de amor”.
Fabrício (setembro de 2020) permaneceu internado no sistema público de saúde por 20 dias, sendo 5 dias entubado e compartilha sua fé e de sua família: “O fundamental é a fé, é algo fundamental na vida. A fé a gente não enxerga, a gente só sente, né? E foi foi algo marcante, porque as pessoas acreditavam que eu iria conseguir sair daquilo, embora eu não acreditasse, embora eu acreditasse que Deus estava me punindo, mas, como a palavra de Deus diz que tem promessa sobre a nossa vida aqui na Terra.” E completa:
“Na verdade, eu me entreguei nas mãos de Deus e falei: ‘ele sabe de todas as coisas". Então, lutei sim pela minha vida, mas fiz a entrega nas mãos de Deus. Ele sabe de todas as coisas, o dia de amanhã pertence a ele. Então se ele disser que eu vou sobreviver, amém, se ele disser que vai me levar, amém. E não cai uma folha de uma árvore sem que ele permita”.
Em algumas narrativas a ligação com a religião era anterior ao adoecimento, e com isso faziam parte de uma comunidade com as mesmas práticas religiosas. Vânia, cristã, comenta das interseções: “Eles oraram muito por mim. Não só do templo que eu vou, que frequento, mas mobilizou muitas pessoas.” Michael Douglas, Testemunha de Jeová, adoeceu em junho de 2021 no sistema público de saúde:
“Porque nós que somos Testemunhas de Jeová não é como se fosse apenas um membro da Igreja. Não é isso. Nós somos uma família mesmo, um ajudando o outro, sabe? Então eu passei por isso, mas as pessoas ali pareciam que estavam sofrendo junto com Andreza, sabe, choravam junto com ela e querendo ou não, realmente estava vivendo aquilo que eu, que o meu caso estava passando, sabe? Então, a religião em si foi algo assim também fundamental, não para mim, que eu estava sendo cuidado aqui, mas para minha esposa foi algo fundamental para ela também. Porque com certeza ela ficou muito…sabe? Porque eu… É claro que eu tive meus traumas, eu tive os meus traumas aqui no hospital. Mas uma das pessoas que mais sentiram foi ela e minha mãe. E a minha mãe também é Testemunha de Jeová. Então as pessoas realmente abraçaram o pensamento positivo na oração pedindo a Jeová que ia dar certo, pedindo, pedindo, pedindo. Então realmente a religião foi fundamental também”.
Alguns entrevistados trazem a espiritualidade sem nenhuma ligação com a religião, como Roberto (setembro de 2020), hospitalizado no Hospital Clementino Fraga Filho:
“Hoje eu me sinto mais próximo de, não frequento igreja, não vou a templo nenhum, nada disso. Eu comigo mesmo, eu procuro fazer a minha oração, eu faço tipo um, eu me sinto uma igreja, vamos dizer assim, sabe? Eu acredito em Deus. [...] Entreguei tudo na mão de Deus e ele, botei esse fardo na mão dele, ele que resolva, ele que resolve os problemas dele, né? E eu vou vivendo a vida. [...] Entreguei, passei tudo pra ele, minha parte financeira, de saúde e tal, entreguei na mão, eu faço a minha parte e ele faz a dele, entendeu? [...] É só dessa maneira só que me impulsiona, me traz mais alegria, confiança, uma positividade.”
Augusto, hospitalizado em maio de 2021 no sistema privado de saúde nos conta sobre a busca para dar um sentido a sua experiência de adoecimento:
“Na hora que eu quase morri, o único lugar que você tem é você e alguém lá de cima. Então eu pedia para alguém lá de cima. Meu pai, que já morreu, falava: ‘pô pai, se você está aqui, me ajuda’. Então a fé vem muito forte, em algum momento, era eu com a minha consciência. Em algum momento, era eu falando comigo mesmo, em algum momento era eu com meus diabos. Quem eram esses Augustos? Alguém que está fora de mim? Alguém que está dentro de mim? A fé se misturava com o meu psicológico o tempo todo, sabe? O tempo todo.”
Luiz (março de 2021) iniciou o contato mais íntimo com a religião dentro do hospital, com a visita da Pastoral: “A gente tinha lá também uma coisa muito legal que era o pessoal da pastoral que ia muito lá. Apesar de, eu acredito muito em Nossa Senhora, acredito em São Jorge, mas eu não sigo religião. Ali foi um troço que, apesar de eu me sentia bem. Quando o pessoal da Pastoral chegava, cantava e fazia a oração eu me sentia bem com aquilo”. Ele compartilha novos hábitos após seu adoecimento: “É um troço até interessante porque, por exemplo, na minha família, minha família toda assistiu o terço, tem o terço das famílias, que é todo dia dez horas da noite, dez e meia da noite. Apesar de não ser praticante, eu tenho escutado o terço com eles [...]. Antes não, eu não tinha esse hábito não”.